Um programa de auditório no sertão pernambucano

Vila Junco é uma localidade incrustada às margens da Transmaconheira, rodovia que corta Pernambuco e tem esse pejorativo apelido por ser usada por traficantes de drogas. Vila Junco foi criada para abrigar as famílias que foram desalojadas por conta das obras de transposição do Rio São Francisco. É um lugar quente, muito quente. Fica a mais de 400 km da capital, Recife. Mas não pense que é um lugar feio, não. Fica às margens do Velho Chico, em um terreno plano de onde se avistam ao longe belas montanhas. Eu estive lá em outubro do ano passado, quando o presidente foi sortear as casas da Vila Junco. A cerimônia previa que ele sortearia cinco das 54 casas. Previa. Do verbo não aconteceu. Ao ser informado que iria sortear apenas cinco casas, ele reclamou e avisou: "vou sortear todas". Mandou a segurança abrir a grade e organizar as famílias, porque queria que todos subissem ao palco para receber suas chaves. E assim foi feito. Colocou todos no palco - governador, deputados, ministros... - para ler o nome dos moradores dos papeizinhos que tirava de um grande saco. Até o cinegrafista oficial teve que ler.
A imprensa tratou a cerimônia, pejorativamente, como um programa de auditório. Realmente parecia. E o Silvio Santos encarnado pelo presidente Lula animou a platéia como nunca. Para os moradores daquela vila afastada de tudo foi um momento mais do que especial. Além de receberem a chave da casa própria, a recebiam de ninguém menos do que o próprio Lula. E com direito a abraço, beijo e foto. Muitos desciam do palco aos prantos. A imprensa aguardava para entrevistá-los e jamais vou esquecer o rosto de uma senhora que, após enxugar as lágrimas, se abraçou na repórter e disse: "minha filha, eu não consigo falar nada. Escreva o que você quiser, eu não consigo falar". E se foi, segurando o choro e agarrando com toda a força do mundo a chave de sua sonhada casa na longínqua, quente mas feliz Vila Junco.

Nenhum comentário: